quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

LUXÚRIA

Luxúria significa intenso desejo pelo corpo, apego aos prazeres carnais, corrupção dos costumes, lascívia, promiscuidade.

A luxúria é vício que atua como força contrária à dignidade do ser humano, desvirtua e degrada a dimensão sexual.

Vimos, diante dos inúmeros estudos encetados, inclusive em posicionamentos não kardecistas, que o conceito de luxúria transita pari passu com o estado de ânimo dos espíritos.

As obras do Pentateuco não são dogmáticas sobre nenhum assunto e não trataram de forma diferente a sexualidade. Portanto, não ferem de rijo sobre o que queira significar a luxúria para os espíritas.

Pelo que pude perceber, a luxúria é uma daquelas cláusulas gerais, onde o operador do espiritismo deve manejar os princípios que o regem e, a partir daí, manejá-los ao caso concreto.

Claro que muitas obras, mormente as psicografadas, tentaram ferir o tema, mas não há uma pá-de-cal sobre a questão, mesmo porque estamos diante dos tempos de transição entre o mundo de provas e expiações e os de regeneração.

Mas algumas ponderações podem aclarar a mente daquele que se debruça sobre a questão e, quem sabe, colaborar para a formação de um pensamento ímpar, que diz respeito a cada indivíduo.

Passemos a elas:

1 – Como o Espiritismo analisa a questão da castidade e virgindade pregada como lei divina e virtude moral gloriosa, símbolo de pureza e santidade que deve ser praticada até o casamento?

A ideia de manter-se casto surge em primeiro lugar com o apóstolo Paulo, que ensinava que tudo é lícito, mas nem tudo convém. Paulo achava que, abrindo mão do sexo e do casamento, os homens poderiam dedicar-se de corpo e alma à causa cristã.

Mais tarde, com Santo Agostinho, a ideia de castidade ganhou força. Ele era obcecado por sexo e, ao libertar-se do desejo – muito por causa da idade - teve a má ideia de acusar o sexo como uma coisa totalmente negativa, como se o sexo, em si, fosse o culpado pelo desejo desenfreado das pessoas. Mesmo dentro do casamento, tinha-o por sujo e feio.

Essas são opiniões.

Jesus não se manifestou a respeito.

Mas pelo que vemos de diversas publicações, sexo não é sujo, nem feio, nem errado. Sexo é troca de energias, e energias divinas, pois através delas as pessoas são atraídas umas às outras e nós temos a oportunidade de reencarnar. Sexo deve ser feito com afeto e responsabilidade, pois somos corresponsáveis pelo que despertarmos no outro.

Pelas energias que movimenta e pelas emoções que desperta, a prática sexual requer maturidade. Somos responsáveis pelos nossos pensamentos, palavras e ações, sempre. Com o sexo não é diferente. Se há afeto e responsabilidade, o sexo é troca de energias divinas. Se o que há é só desejo carnal, a prática sexual é manifestação de instintos animais que ainda sobrevivem em nosso íntimo. E esses sim, irracionais que são, ferem o caminho de dignidade e evolução de nosso espírito. São esses instintos que trazem as conexões com energias mais densas.

2 – Como a Doutrina analisa a sentença da Igreja Católica que fala que a Justiça Divina poderá corrigir com duros revezes as pessoas que exercerem o sexo desvinculado e fora do casamento, mesmo que essas pessoas justifiquem o ato dizendo que o fizeram com amor e com respeito ao parceiro? Do ponto de vista espírita não haveria algum carma negativo no ato sexual pelo prazer, simplesmente, sem o compromisso de namoro sério?

O posicionamento das Igrejas a esse respeito reflete a opinião dos teólogos, não a orientação de Jesus. Se Jesus julgasse importante que o sexo só fosse praticado estritamente dentro do casamento, ele teria se pronunciado a respeito.

Carma é uma palavra do sânscrito que quer dizer ação. A toda ação corresponde uma reação. Ao nos envolvermos sexualmente com alguém, somos responsáveis pelo que este envolvimento possa gerar, fisicamente, emocionalmente, moralmente. Por isso a necessidade de respeito e afeto. O sexo só por prazer, mesmo que praticado com o consentimento dos envolvidos, pode ocasionar sequelas emocionais, como sensação de culpa, arrependimento ou a paixão sem reciprocidade. Responderemos pela eventual dor ou desequilíbrio que causarmos em quaisquer pessoas.

3 – Como a doutrina enxerga a liberdade sexual da mulher? Como algo positivo ou como algo degradante nos dias atuais?

Homens e mulheres são espíritos, portanto, têm direitos e deveres iguais.

4 – Como o Espiritismo vê os casais amasiados? Eles estariam vivendo em desacordo com a Lei Divina ou não?

A palavra “amasiado” deriva do latim “amare”, amar. Se é realmente o amor que prevalece, não há nada a ser reprovado. A Lei Divina não estabeleceu normas para a união de duas pessoas que se querem bem. O casamento civil e religioso é invenção dos homens. Somos espíritos, e para o espírito não faz diferença uma folha de papel ou as palavras sacramentais decoradas por um religioso, por mais respeitável que seja.

O amor é do espírito, não da matéria. Os espíritos unem-se por afeto, não por práticas.

É bom lembrar que a Doutrina Espírita não é um código de certo X errado, de pode X não pode. A Doutrina Espírita enfatiza, sempre, a consciência livre. Não há proibições, o que há é a proposta de conscientização de nossas responsabilidades. Tudo envolve intenção e responsabilidade.

5 – O pensamento religioso dogmático cristão prega que o único lugar para o ser humano manifestar o seu impulso sexual que agrada a Deus é dentro do matrimônio, fora dele tudo é pecado… tipo: sexo solitário, masturbação a dois, toques em partes íntimas, pornografia, olhares ardentes, visualização de pessoas nuas ou seminuas, fantasias sexuais com alguém não casado, fetiches e intensos desejos de prazeres. Como a Doutrina Espírita esclarece essa questão?

A questão sexual exige muito cuidado pelo grau de energia que envolve o sexo. Sempre sintonizamos com os espíritos, encarnados ou desencarnados, que mantêm os mesmos desejos, ideias, sentimentos e ideais que nós. Focando-nos no sexo, real ou imaginário, com ou sem o estímulo de imagens, estamos sintonizando com milhares de mentes que alimentam esses mesmos desejos. Nosso desejo inicial, então, é potencializado pela soma dos mesmos desejos externalizados por milhares de mentes sedentas de sexo.

A prática sexual, seja ela qual for, requer afeto e responsabilidade.

A linguagem primordial do espírito é o pensamento. Pelo pensamento entramos em sintonia com os nossos semelhantes, inevitavelmente. Sexo é energia. Não convém conter essa energia forçadamente nem liberá-la sem critério. A palavra-chave, como em tudo, é equilíbrio.

A Doutrina orienta ao uso da razão. O desejo sexual exacerbado nos prende à matéria. É impossível conciliar desejo carnal e elevação espiritual. Estamos encarnados, temos corpos físicos sensíveis ao prazer e à dor, e faz parte do uso do livre-arbítrio optar pelo prazer. O prazer é necessário em nosso estágio evolutivo. A busca por prazer nos estimula ao progresso. Mas nesta busca nos movimentamos praticamente apenas nos aspectos materiais da vida, quando nosso grande objetivo é o progresso do espírito.

Sabemos que forçar a natureza tem as suas consequências. Se represarmos um rio sem lhe dar vazão, a represa pode se romper e causar grandes danos. Por outro lado, a civilização só foi possível porque o homem conseguiu usar a natureza a seu favor, construindo diques, canais e barreiras de modo a aproveitar racionalmente os recursos dos rios, em torno dos quais se formaram as primeiras cidades.

O mesmo cuidado devemos ter com o sexo. Não impedir o seu fluxo normal com barreiras estanques, mas controlar o seu fluxo para tirar dele o melhor proveito para o corpo e o espírito.

O cuidado que todos devemos ter é em relação aos sentimentos do próximo. O ideal é examinar os sentimentos antes de envolver-se sexualmente com alguém.

O Espiritismo orienta que sigamos a moral do Cristo. Se fizermos isso, naturalmente seremos responsáveis a ponto de cuidarmos da própria saúde e de zelarmos pela saúde do próximo – física e emocional.

O Espiritismo ensina que as Leis de Deus estão em nossa consciência, e, de acordo com elas, sabemos intimamente o que convém e o que não convém.

Todas as questões acima giram em torno da responsabilidade. Quem fica com alguém sem compromisso, só pelo prazer momentâneo, pode fazer isso várias vezes sem prejudicar nem a si mesmo nem ao outro. Mas não há como saber o que pode resultar de um encontro íntimo aparentemente sem compromisso.

Em qualquer contato íntimo entre pessoas há troca de energias. Elas ficam durante minutos ou horas, com ou sem relações sexuais, transitam livremente. Já o sexo forma uma ligação energética entre os parceiros que se estende por muito tempo.

Experiências por curiosidade, por modismo ou por pressão do grupo são um mergulho no desconhecido. A negligência com sentimentos, emoções e sensações energeticamente poderosas exigirá o reajuste.

Somos rodeados de espíritos que gostam do que gostamos. Nada que seja estritamente material pode atrair espíritos bem intencionados. O sexo casual, sem afeto, apenas pelo prazer, atrai muitos espíritos que sentem necessidade dessas mesmas energias. Forma-se com eles verdadeira simbiose, trocando energias e influências.

O sexo é uma dádiva de Deus e uma fonte legítima de prazer e rearmonização energética. Mas a vivência do sexo saudável pressupõe afeto.

E a razão do afeto pertence a cada um.

Recorramos ao Livro dos Espíritos:

696. Que efeito teria sobre a sociedade humana a abolição do casamento?Seria uma regressão à vida dos animais?

O estado de natureza é o da união livre e fortuita dos sexos. O casamento constitui um dos primeiros atos de progresso nas sociedades humanas, porque estabelece a solidariedade fraterna (...).

Daqui, forçoso concluir também ser da evolução todas as demais conjugações humanas onde haja uma solidariedade fraterna!

697. Está na lei da Natureza, ou somente na lei humana, a indissolubilidade absoluta do casamento?

É uma lei humana muito contrária à da Natureza. Mas os homens podem modificar suas leis; só as da Natureza são imutáveis.

698. O celibato voluntário representa um estado de perfeição meritório aos olhos de Deus?

Não, e os que assim vivem, por egoísmo, desagradam a Deus e enganam o mundo.

699. Da parte de certas pessoas, o celibato não será um sacrifício que fazem com o fim de se votarem, de modo mais completo, ao serviço da Humanidade?

Isso é muito diferente. Todo sacrifício pessoal é meritório, quando feito para o bem.

Não é possível que Deus se contradiga, nem que ache mau o que Ele próprio fez.

701. Qual das duas, a poligamia ou a monogamia, é mais conforme à lei da Natureza?

A poligamia é lei humana cuja abolição marca um progresso social. O casamento, segundo as vistas de Deus, tem que se fundar na afeição dos seres que se unem. Na poligamia não há afeição real: há apenas sensualidade.

Aqui, é necessário um adendo: Relações não-monogâmicas não são poligamia, nem poliandria. Poligamia é onde um homem pode possuir várias mulheres, mas uma mulher não pode possuir mais de um homem. Poliandria é o oposto. Ambos são sistemas de dominação e subjugação. Dizem sobre posse, e não sobre o afeto.

Já nos relacionamentos não-monogâmicos, todos as participantes, homens e mulheres, permanecem sempre em pé de igualdade: pessoas humanas adultas que podem usar e dispor de seus corpos e sentimentos, livre e consensualmente. É importante lembrar que um relacionamento não-monogâmico é, antes de tudo, um relacionamento. Um relacionamento com pactos, compromissos, amor, planos - e o que mais as pessoas participantes consensualmente decidirem. Relacionamentos não-monogâmicos são difíceis. Trabalhosos. Quase impossíveis. As pessoas monogâmicas quase sempre encaram as não-monogâmicas como se fossem todas libertinas insaciáveis e esse conceito é absolutamente equivocado. Relacionamentos não-monogâmicos têm o mesmo potencial de luxúria que os monogâmicos. Tudo depende do afeto que une os envolvidos.

Disse Emmanuel, no livro Senda para Deus, psicografado por Chico Xavier:

Erótica

A Erótica está na alma, assim como a sede e a fome.
Tem nome de Amor em cada criatura.
No intuito de educá-la, temos nós muitas vidas.
O povo que a distorce sofre grandes problemas.
Nos santos e nos anjos, ela está sublimada.
Se alguém erra no Amor, compadece-te e ampara.
Por erótica, entenda-se ser essa energia sexual da qual todos somos dotados!

E Emmanuel nos socorre mais uma vez, desta vez no livro Vida e Sexo, também psicografado pelo Chico:

Amai, pois a vossa alma, porém, cuidai igualmente do vosso corpo, instrumento daquela. Desatender às necessidade que a própria Natureza indica, é desatender a lei de Deus. 

O instinto sexual, exprimindo amor em expansão incessante, nasce nas profundezas da vida, orientando os processos da evolução. Toda criatura consciente traz consigo, devidamente estratificada, a herança incomensurável das experiências sexuais, vividas nos reinos inferiores da Natureza. De existência a existência, de lição em lição e de passo em passo, por séculos de séculos, na esfera animal, a individualidade, erguida à razão, surpreende em si mesma todo um mundo de impulsos genésicos por educar e ajustar às leis superiores que governam a vida. 

(...) É fácil reconhecer que toda criatura humana, sempre nascida ou renascida sob o patrocínio do sexo, carreia consigo determinada carga de impulsos eróticos, que a própria criatura aprende, gradativamente, a orientar para o bem e a valorizar para a vida. 

Diante do sexo, não nos achamos, de nenhum modo, à frente de um despenhadeiro para as trevas, mas perante a fonte viva das energias em que a Sabedoria do Universo situou o laboratório das formas físicas e a usina dos estímulos espirituais mais intensos para a execução das tarefas que esposamos, em regime de colaboração mútua, visando ao rendimento do progresso e do aperfeiçoamento entre os homens.

Cada homem e cada mulher que ainda não se angelizou ou que não se encontre em processo de bloqueio das possibilidades criativas, no corpo ou na alma, traz, evidentemente, maior ou menor percentagem de anseios sexuais, a se expressarem por sede de apoio afetivo, e é claramente, nas lavras da experiência, errando e acertando e tornando a erras para acertar com mais segurança, que cada um de nós – os filhos de Deus em evolução na Terra – conseguirá sublimar os sentimentos que nos são próprios, de modo a erguer-nos em definitivo para a conquista da felicidade celeste e do Amor Universal.

Emmanuel foi de uma perfeição ímpar nesse texto. Sou forçada a anotar, com âncoras nele, que o sexo é ferramenta de aprendizado e, como tal, pode expurgar muito do que nos afasta do Amor Universal citado: o egoísmo, a obsessão pelo outro, os julgamentos preconceituosos, os traumas, os titubeios perante nosso “eu” mais íntimos e etc.

Mister considerar que cada caso é um caso, sem desconsiderar jamais que o equilíbrio e a disciplina mental precisam ser alcançados.

Por isso o Emmanuel, no livro O Consolador, também da lavra de Chico Xavier, fecha com o primor que lhe é peculiar: 

“ao invés da educação sexual pela satisfação dos instintos, é imprescindível que os homens eduquem sua alma para a compreensão sagrada do sexo”.

Espero ter conseguido tratar o tema com a delicadeza, o respeito e a generosidade que ele merece! 

(Paula Duran)

Um comentário:

  1. O sexo sempre foi tratado como um tabu, para todos que foram educados com os preceitos católicos sempre foi tratado como pecado, trazendo para seus problemas psicológicos e sexuais criando pessoas com problemas de timidez e desvios sexuais.
    O espiritismo traz uma luz sobre o assunto e consolo e animo para aqueles que erraram a voltar a luz e o recomeço

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