segunda-feira, 24 de março de 2014

REZAR SEM NEUROSE

Texto inspirado nos Escritos do Frei Neylor Tonin.
(Padre Jeferson)
Texto bíblico: Evangelho: Mt 6, 7-15

Quais as formas e os meios que rezamos? Como rezamos? O que rezamos?
Não só rezar, mas, também e principalmente, ser religioso sem neuroses.
É um desafio para todos nós. Acredito que tudo que façamos deva ter um pouco de neurose.
 Será?
Na verdade, a oração é apenas uma manifestação de um jeito mais amplo de ser religioso, que pode ser feliz ou triste, alegre ou amargo, adorante ou farisaico, alimentador ou condenatório, livre ou neurótico.
Este jeito pode, tristemente, caracterizar-se por expressões de modos e inseguranças, de preguiças enfastiadas ou de falsa compreensão relacional, de falta de aprumo espiritual ou de pessoas apresadas e insatisfeitas, de comandos intempestivos e desmandos intemperantes.

Rezar não é fácil.
Na reza ou na oração deve ter um sentido para a vida, isto é, um sentido mais profundo para a vida.
Rezar bem, com a alma e coração, com intensidade e pureza interiores, com despojamento e olho espiritual, não é coisa para marinheiros de primeira viajem ainda fascinados pelo turbulento revolver-se das águas e enamorados por seu fascínio, mas desconhecedores de seus perigos.
Rezar é bom e necessário, é até gostoso e inebriante, mas os grandes orantes sentiram na pele e ensinaram, em seus testemunhos e memórias, que não é fácil contemplar o invisível onde se esconde o rosto do Amado, de Deus.

Sendo assim, a alma que tanto deseja Deus, sofre imensamente pela insatisfação de ser tão pouco dele e de tão pouco poder amá-lo e sentir-se por Ele amado.
Por que sentimos isso.
Porque somos corpo, corpo pesado de concupiscentes sentidos físicos, quão difícil nos é mergulhar no invisível! Nesse meio ao colapso, não sabemos o que pedir ou a oração que fazer ou a graça que desejamos.
Na verdade a grande graça a ser pedida, neste estágio do itinerário espiritual, será a da perseverança e a do não-desespero diante do aparente desaparecimento de Deus.

Há, na vida religiosa (de oração), um meio-termo que é insatisfatório e nele se revelam as neuroses de nossa relação com Deus.
Este meio-termo se caracteriza por um desenfoque da verdadeira oração, no qual Deus é o centro e o que reza se põe de joelhos.
Quando ocorre o contrário, isto é, quando é o orante o centro e Deus é apequenado, ficando a serviço das necessidades de quem reza, a oração ganha traços de neurose e perde a fecundidade da graça divina.
O que consistem esses traços neuróticos?
Consistem em adulterar a natureza das coisas e das pessoas, de Deus e do orante. Estabelece-se uma inversão de importância, ficando Deus como o criado-mudo da história e o orante como o protagonista do discurso e da ação. 
O orante, sendo mendigo, comporta-se como patrão, e Deus, sendo Senhor, é tratado como empregado.
A oração não passa, então, de um enlouquecido cozinhar das carências humanas e não se dirige a Deus Senhor e doador das graças.
Estas são exigidas como expressão da pobreza humana, e não como escuta e deferimento da generosidade e bondade divinas.

As pessoas dizem que reza tanto e Deus não atende, ou ainda rezo muito e Deus me atende.
 Em ambas os casos, não há uma fé explicita em Deus, mas sim apenas estados emocionais prementes e assustador ou neuroses.
Nestes casos, a oração não tem alma de adoração e de encantamento, mas se materializa como atropelo de um espirito que manda comanda, que exige e cobra os dividendos da fé.
É preciso atentar para este tipo de apequenamento de Deus e para este comportamento espiritual, lembrando-se de que Deus nos atende porque é Deus e nos ama, e não porque acreditamos nele.
A verdadeira oração se fundamenta num pressuposto existencial: quem reza reconhece e exalta a grandeza de Deus, ao mesmo tempo em que aceita e confessa sua insignificância. Não-neurótica é a oração que tem como centro e endereço Deus.


(Publicação extraída do site http://fasdapsicanalise.com.br/)


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